quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Mister Santos 2008


Faz alguns meses que comecei a trabalhar em equipe com Fernando Marques, Rodolfo Peres, Samuel Vieira e Marcelo Bela... Quando percebi estávamos viajando juntos, tomamos café juntos enquanto palestrávamos Brasil afora. Recebemos novos integrantes, fortalecendo o conhecimento e a responsabilidade do grupo, ganhamos de presente o Eriquinho (Caperuto - nosso futuro body builder, ainda mirim... hehe), sempre apoiados pela Cris (Trigo-aveia-miss-fitness Santos everything) e pelo Alexandre (que sempre vai na frente preparando o terreno e resolvendo o que tem de ser solucionado antes de entrarmos em cena - as vezes acho que ele é o mais forte de nós: junto com a Cris, é o primeiro que chega e o cara que apaga a luz...).

Em um momento ouvi alguem me falar eu quero - eu posso - eu faço, e naquele momento eu já cuidava do que comia o bastante para ter um perfil com pouca gordura, o suficiente para ter uma musculatura mais destacada, eu já tinha uma musculatura trabalhada por 17 anos da minha vida e tinha amigos que me davam apoio e coragem (porque as vezes agente pega emprestado quando não tem... e amigo que é amigo te dá sempre mais do que você precisa) e já tinha conhecimento acumulado o suficiente para ajudar as pessoas que me procuravam a atingir a vitória que elas desejavam. Mas confesso: ainda não tinha a menor pretenção de um dia estar junto com as pessoas que fazem as capas das revistas de esporte ou estar na cabeça do pessoal que treina com vontade mesmo sem ter o suporte necessário: o pessoal que treina por pura fé em poder chegar ao objetivo se fiver esforço devido.

Mas campeões não se fazem apenas de necessários.. campeões, são extraordinários...

Com a convivência, aprendi. Com a companhia, cresci. Com a amizade, acreditei.

E no momento seguinte, estava eu contando minha alimentação em gramas, descobrindo que mesmo quando achamos que temos uma vida regrada, a disciplina para se tornar um campeão exige precisão de números exatos de alimentos e suplementos exatos.

Cheguei no limite da minha capacidade de suportar contrações musculares repetidas, desrespeitando sistematicamente toda e qualquer lei que rege os princípios de fadiga muscular mecânica e neurológica, tirando do meu maquinário muscular em 40 minutos o que talvez eu não tenha tirado em anos de treinamento. Aprendi com o Fernando que treinar para o bodybuilding exigia um pouquinho mais...

Treinei na madrugada porque estava entre sequencias de plantões, treinei depois das 23h porque tinha uma lista infindável de pacientes no consultório com todas responsabilidades que esta demanda cria para cuidarmos. Contei repeições entre pensamentos de condutas, contei séries lembrando das pessoas que iria visitar, prescrever, submeter a cirurgia nos dias que viriam. Treinei antes das 5h da manhã porque o dia seria caótico. Treinei ao chegar do plantão e antes de entrar no ambulatório em vez de dormir. Comi o que era necessário em vez do que tinha vontade. Bebi água em vez das bebidas mais perfumadas e convidativas. Dormi 1h30 em noites inteiras, fugi da dieta para o jejum ao entrar em procedimentos intermináveis, tentando conciliar o desejo de ser campeão com a responsabilidade de ser o médico, situação que nunca foi um motivo de dúvida pois antes de tudo sou médico, mas tenho de admitir para vocês que tais situações me fizeram ter de buscar reinícios sequenciais enquanto eu sabia que meus adversários na competição estavam em condições melhores alem das que eu dispunha. Mas eu disponha de conhecimento, (o mais importante) e vontade (o mais determinante).

Segui em frente e para quem conta de trás para frente, os meses se tornaram semanas, que se tornaram dias e que, exatamente 5 dias antes da competição, na casa de um amigo, decidi que iria competir, só pelo fato de ter ouvido dele: relaxa... vou estar com você.

Aprendi algumas poses 36h antes da competição, tentava ensair algo enquanto em intervalos do trabalho, aprendi o que quer dizer sede, fome e cansaço extremo.

Saí da minha casa num sábado de manhã com pessoas e promessas e responsabilidades e um sonho: mostrar o quanto é valioso o apoio das pessoas que selecionei com cuidado durante anos para fazerem parte da minha família.

Vi o Gustavo ficar com dor nas costas de me pintar para a competição, minutos antes de subir ao palco. Vi o Samuel ficar tão empolgado como se fosse ele próprio que fosse competir, e na hora que tudo branqueou na minha frente e que fiquei a um passo de desistir, ainda no backstage, porque a sede, o cansaço, a fome eram intensas, mãos mais leves que as minhas sustentaram minhas centenas de kilos apenas com palavras, essas sim fortes, e pensamentos, esses sim gloriosos.

Me levantei devagar. Ouvia novamente, enxergava... com muito mais clareza o que tinha de fazer do que o chão a minha frente, mas enxergava e então fui mandado olhar para o alto e "curtir" o que eu estava prestes a fazer: subir ao lado dos "caras grandes das revistas" e deixar a responsabilidade de vencer para eles, porque o meu mérito de estar ali e disputar e de me igualar em disciplina e determinação a eles, eu já havia conquistado.

Subi a escada e o ar voltou e a hipoglicemia passou e a sede deu trégua. Cumprimentei meus camaradas, que já não eram mais meus adversários: pois é, descobri isto nquela hora... Serjão, Arthur... uma vez numa sala de pesos, éramos frutos do mesmo esforço e do mesmo trabalho... de fato, eu já não tinha adversários: tinha achado meus pares, com quem eu não disputaria 17 anos de treinamento, disciplina e determinação, disputaria simplesmente opiniões... e independente do que essas opiniões decidissem, aind que fossem o motor do campeonato, eu era aceito naquele grupo, como alguém que tinha conquistado o direito de ali estar, ali permanecer e ali engrandecer o nome do esporte por um trabalho bem feito.

No palco, olhei para quem eu de fato me importava não decepcionar. Lembrei de quem eu gostaria que estivesse ali. E essas poucas pessoas vibraram ao ver que o cara branco de branco com a pele pálida e carimbo no bolso podia, pela intervenção deles, estar entre estrelas, disputando pódios como eles mesmo já fizeram - todos, sem excessão. Vi a admiração nos seus rostos e aprendi engolindo a emoção que essa história de não dever nada a ninguém é só história - devemos nossa felicidade a quem está do nosso lado, tendo o mesmo cuidado conosco que essas pessoas tem, como se nós fossemos em parte propriedade dessas pessoas também. Cuidar de si é cuidar do pedaço das pessoas que amamos e que mora inevitavelmente dentro de nós, e que é muito feio da nossa parte desprezar isso.

Me fortaleci pelo olhar dessas pessoas e cresci no palco - fiquei forte de repente e quando percebi que não sabia por onde começar, comecei ouvindo as vozes deles... fiz o que eles me mandaram: venci a mim mesmo...

Sobre obter a vitória?

Oras... a vitória e o prêmio agente recebe antes... tambem aprendi isso na hora... nada paga coisas como ir treinar com o Samuca na madruga porque é a hora que sobra pra nós, ou ainda ver a cara de admiração do Gustavo ao observar o amigo de tantos anos trilhando o mesmo caminho dele, ou ainda ver esse mesmo Gustavo Pasqualotto cuidar de você como se voce não soubesse nem mesmo cortar sua própria comida... e eu, naquele dia, não sabia...

Não tinha certeza do resultado, mas pensado tudo isso em um segundo de apresentação, eu já tinha notado que o que eu tinha de fazer já tinha sido feito. Me tranquilizei, abri um sorriso e curti... assisti o show de um lugar privilegiado... Vi os caras fazendo o trabalho deles até que... era hora de fazer o meu...

Me perdi completamente e a presença de espírito misturado aos gritos alucinados de orientação do Gu e do Samuca me colocaram no lugar e fiz o meu papel...
De certa forma, ao término da apresentação eu já sabia que não poderia ser o primeiro lugar, mas algo me deixava com a pulga atrás da orelha... era tanta gente acreditando em mim que eu também estava começando... algo ainda poderia acontecer...

E foi na noite, ao refazer tudo só que num tempo maior que ouvi meu nome ser chamado para receber o troféu de vice-campeão e puxa vida... que honra poder curtir esse momento, não para mim, mas para essas pessoas todas que trilharam ao meu lado este sonho nesses ultimos meses e principalmente nesses ultimos dois dias, quando aconceceram coisas inimagináveis, inclusive na madrugada anterior ao campeonato.

Quem sabe um dia eu conte toda a história...
(só as 36 horas entre sexta manha e domigo manhã mereceriam um livro!)

Mas por hoje, fica a história curta do médico que saiu de um plantão de 24h na quinta feira, atendeu seu consultório na sexta e no sábado foi ganhar o Mister Santos... e por razões muito minhas eu sei que ganhei, como vice-campeão na súmula, mas na vida, o primeiro lugar, sempre...

PS: aliás, no domingo de manhã pós campeonato eu já estava trabalhando: nem bem a tinta saiu e eu estava em reunião com os dirigentes da Seleção Brasileira de Rugby.... desde às 13 horas deste domingo dia 7, a seleção brasileira tem um médico chefe novo, e esse cara traz um saco de novidades que nem o papai noel tem igual... me aguardem... hehehe...

PS2: e o plantão da noite do domingo no Santa Marina foi atribulado como sempre... jogo de futebol, excessos de alcool de felicidade = fraturas e ortopedistas sem dormir Sao Paulo afora...

PS3: chega... sao 9:40 e dexei a manhã livre pra treinar que o consultório começa cedo hoje... a partir de hoje eu volto ser o cara de trás do palco, mas com uma estrelinha a mais...



abraço forte, saúde e muita performace (com muito sucesso, se Deus quiser e se a vontade e disciplina de cada um assim merecer...)

Muzy

(médico ortopedista, traumatologista, especialista em fisiologia e biomecânica aplicados ao exercício - atual vice campeão Class I do 54o Mister Santos, dez de 2008 - na foto ao lado, vestido à carater... e que assim seja!)

EU QUERO - EU POSSO - EU FAÇO




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